Cleber Soares, diretor de Inovação do Mapa, anuncia novo paradigma de soluções com base biológica no agronegócio
Por Redação
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hand holding fertile soil for plant to growing in nature concept.
Por Cleber Oliveira Soares*
O Brasil tem uma oportunidade ímpar de promover um novo salto na agricultura a partir de aplicações sustentáveis da sua biodiversidade e seus recursos naturais. A bioeconomia será a alavanca para o novo agro.
A agricultura brasileira desenvolveu-se nas últimas quatro décadas baseada em ciência, tecnologia e inovação, e sustentada pelo espírito empreendedor dos produtores. Produzimos uma grande diversidade de produtos agrícolas, aquícolas, pecuários, florestais e seus derivados. O País influencia muitos hábitos alimentares, tem um mercado interno importante, e é forte exportador. Mas, o mundo demanda que entreguemos mais e mais alimentos sustentáveis para as nações.
Numa perspectiva temporal e de complexidade, vivemos dois grandes movimentos na agropecuária brasileira e um terceiro se avizinha. Partimos do primeiro grande salto brasileiro, com a revolução verde, entre as décadas de 1960 e 1990, onde a base dos sistemas era a monocultura, com visão monodisciplinar, produção focada em comodities, insumos de base sintética, e ciência adaptativa.
Vivemos a segunda onda iniciada nos anos 1990, com os sistemas de produção integrados, baseados em consórcios de culturas, intensificação sustentável, com visão multidisciplinar, produção focada na transição comida-alimento, manejos integrados visando eficiência, e ciência sistêmica.
Está germinando o próximo salto. Uma agricultura baseada em sistemas de produção complexos com alto nível de especialização, visão transdisciplinar, focada na multifuncionalidade da agropecuária, dos alimentos e de seus derivados, cuja ciência para alavancar tudo isso será cada vez mais complexa. E os avanços em inovação serão suportados por ativos de base biológica.
É neste ambiente efervescente da agricultura tropical que nasce o Programa Nacional de Bioinsumos que visa ampliar e fortalecer a utilização de ativos biológicos para promover o desenvolvimento sustentável da agropecuária brasileira. Construído sob a liderança do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, alinha as necessidades de inovação nos segmentos agrícola, aquícola, florestal e pecuário.
Pretende alavancar as cadeias produtivas e beneficiar o agro com diretrizes e orientações sobre bioinsumos. E, ainda, ofertar fomento, estímulo, tecnologias e inovações que viabilizem a geração de mais produtividade, renda, riqueza, qualidade de vida para o produtor rural e para a sociedade. É uma aposta para o novo futuro da agricultura.
O mundo agrícola busca incrementar a produtividade de seus cultivos, reduzir custos, desenvolver sistemas cada vez mais resilientes e sustentáveis, integrar sistemas, manejos agrícolas e zootécnicos, e promover crescimento vertical da agropecuária. São poucas as perspectivas, em curto espaço de tempo, para mitigar essas questões, especialmente quanto aos elementos de inputs dos sistemas de produção.
Os bioinsumos compõem uma tendência global, todos os grandes players agrícolas estão atentos para tal segmento de mercado. Nesse cenário, o Brasil, mais uma vez, pode fazer a diferença para o mundo e cunhar o terceiro salto da agricultura contemporânea.
Precisamos ousar! Foi assim que a cientista Johanna Döbereiner, pioneira em biologia do solo, apostou, entre os anos 1970 e 1990, e promoveu, talvez, a maior contribuição em inovação disruptiva da agricultura mundial. Hoje, nos sistemas de produção brasileiros, cerca de 40 milhões de hectares são cultivados com bactérias promotoras de crescimento de plantas, mais de 10 milhões de hectares recebem produtos para o controle biológico de pragas.
Os insumos biológicos trazem uma economia anual ao País da ordem de U$ 13 bilhões com a exploração da fixação biológica de nitrogênio, somente com a cultura da soja, e de aproximadamente R$ 165 milhões com a aplicação de produtos para controle biológico. Não há dúvidas sobre o que podemos chamar de inovação de fato!
É crescente a demanda por bioinsumos aplicados aos diversos setores econômicos. No Brasil, nos últimos três anos, há um aumento no registro de produtos biológicos e o ingresso de produtos nacionais e importados no mercado, com o surgimento de empresas produtoras de insumos biológicos de diferentes portes, tanto de capital nacional, como internacional.
Estima-se um mercado nacional de U$ 200 milhões, e global de U$ 8 bilhões, com taxa de crescimento de 13,80% ao ano, especialmente na américa latina, pelo potencial de produtividade da agricultura tropical, e pela demanda dos setores produtivos e da sociedade. Aqui o jogo é de ganha-ganha. Ganhamos todos: o produtor, as cadeias produtivas, o setor de base tecnológica, a indústria nacional, a sociedade e o País.
Não só defensivos naturais, os bioinsumos trazem diversas vantagens e benefícios para o produtor rural. Além de serem alternativas para o manejo, controle e combate a pragas, parasitos e patógenos e doenças de animais e plantas; para a otimização de produtos e processos relacionados à pós-colheita e à agroindústria; de agregar valor a produtos; dentre diversas aplicações.
Destaca-se que, além de um grande número de potenciais bioinsumos a serem desenvolvidos (inoculantes, promotores de crescimento, defensivos, biofilmes, fitoquímicos, biofertilizantes, probióticos, nanopartículas, emulsões, enzimas, proteínas), temos, como poucos países do mundo, a oportunidade de sermos protagonistas na bioeconomia baseada na maior biodiversidade do planeta.
O consumidor se beneficia não só pelo aumento da oferta e redução do preço dos alimentos, como também pela entrega de tecnologias que podem conferir mais qualidade aos sistemas de produção, aos produtos agrícolas, aos alimentos e à segurança nutricional.
Um exemplo do benefício direto ao consumidor são o uso de microrganismos lácteos para produção de queijos, iogurtes e outros derivados do leite; aplicações no desenvolvimento de bebidas e alimentos etc. Quem não gostaria de aumentar o tempo de prateleira de uma maça, com um biofilme natural, que também pode carrear vitaminas, minerais ou outros benefícios?
Ao relacionar as dimensões de sustentabilidade (social, ambiental e econômica) no desenvolvimento de insumos, busca-se ampliar a percepção e a entrega de valor na utilização dos recursos naturais. Essa visão alinha-se à bioeconomia que, em sua vertente do agronegócio, considera a utilização de recursos de base biológica, recicláveis e renováveis.
O Programa Nacional de Bioinsumos pretende consolidar uma visão contemporânea com os princípios da sustentabilidade para incrementar a produtividade, fortalecer a produção, adicionar valor aos produtos agrícolas e entregar valor para a sociedade brasileira. O Brasil está rumando para um novo salto tecnológico na agricultura mundial. É o agro que evolui, e ousa escrever um novo capítulo do nexo agricultura-saúde-sociedade.
*Cleber Oliveira Soares é diretor de Inovação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento