Comendo churrasco de unicórnios

Frequentemente tenho sido abordado e questionado a respeito de notícias sobre o desenvolvimento de carnes não convencionais, produzidas a partir de vegetais ou da multiplicação em laboratório de células animais. Vivendo em um país que tem mais bovinos que humanos, grande produtor e exportador também de carne de aves e suínos, com cadeias produtivas importantes em termos de emprego e renda, estaríamos a mercê destas tecnologias potencialmente disruptivas?

Aqui mesmo no AgEvolution são várias as matérias que abordaram o tema, logicamente pela perspectiva de desenvolvimento destas tecnologias a partir de startups em países como Estados Unidos, Israel e Comunidade Europeia. O assunto está cada vez mais atraindo empreendedores que enxergam neste mercado de centenas de bilhões de dólares, e em franco crescimento, uma oportunidade de criar o próximo unicórnio (startup que atinge valor de US$ 1 bilhão).

Apesar de ainda serem incipientes os volumes de produção destas soluções não convencionais, está cada vez mais comum vermos notícias e mesmo produtos sendo apresentados no mercado. Em recente viagem a Califórnia fiquei impressionado com a quantidade de restaurantes especializados em hambúrguer que já estão oferecendo o lanche com a opção de substituir a carne tradicional pelo “Impossible Burger”. Com um acréscimo de US$ 5, o lanche do cardápio vem com um hambúrguer feito à base de vegetais que têm textura, sabor e até sangram como aqueles feitos com carne de verdade. E tenho de admitir que a experiência não me decepcionou. Não sou um grande fã de hambúrguer, ainda prefiro comer nacos de carne, mas para quem aprecia carne moída assada, o produto tem tudo para ser um sucesso.

Considerando que estes produtos já estão mimetizando o sabor e aparência da boa e velha carne, o risco começa a ser cada vez maior de consumidores que valorizam outros atributos migrem para estas opções. E são vários estes “outros atributos” que podem influenciar a decisão de compra: o apelo de bem-estar animal ou questionamento a respeito do processo de abate, por alguns considerado cruel e desumano; o impacto no aquecimento global, que para muitos está relacionado a emissões de gases de efeito estufa a partir da flatulência bovina, tema bem controverso; potencial redução do impacto ambiental do transporte, pois laboratórios e fábricas poderiam ser construídas ao lado de centros de consumo; redução do uso de água, seja nas fazendas ou nos processos de industrialização; e ainda a redução ou eliminação de antibióticos e produtos químicos usados nas fazendas.

Veja bem, não sou um propagandista destes pretensos atributos, na verdade questiono a maioria deles, e sigo sendo um pecuarista entusiasmado com a qualidade de nossos rebanhos e das carnes que servimos em nossas mesas. Todavia, penso que precisamos ficar atentos a este mundo novo que está surgindo. Em pesquisa recente nos EUA, 60% dos consumidores disseram que provariam carnes não convencionais e 27% deles compraria um pacote no mercado. Um terço, isso é impressionante!

Anúncio na porta do restaurante Umami estimulando o consumidor a “trair a carne” (Cheat on Beef)

Hamburgueria Unami, anunciando três novos sanduíches com Impossible Burger

Mesmo tendo provado e tido uma boa experiência com o “Impossible Burger”, não tenho a menor propensão a substituir meus churrascos e suculentos filés por soluções vegetais ou bifes de proteína de laboratório. Apesar disso, estas novas tecnologias tem o potencial de criar novos mercados e negócios, quem sabe novos unicórnios e, certamente, um grande risco para nossa pecuária tradicional. Vale acompanhar!